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A bíblia da boa mesa em Nova York
27.outubro.2000

Tania Menai, de Nova York

“Adoro Paris. Mas aqui não é como Nova York, onde se pode pedir comida chinesa às quatro da manhã. Mas, pensando bem...quem é que pede comida chinesa a essa hora?”, pergunta Woody Allen no documentário Wild Man Blues (Woody Allen in Concert). Muita gente. O nova-iorquino da gema sabe aonde solicitar comida chinesa, indiana-kasher ou malaia independente dos ponteiros do relógio. Morando em apartamentos minúsculos, cujas cozinhas comportam ou a geladeira ou o fogão, e trabalhando 24/7 ( 24 horas, sete dias por semana), ninguém sobrevive sem o Zagat Survey, a bíblia que classifica 2.000 dos 15.000 restaurantes da cidade. Atualizado anualmente, o guia vende 650.000 exemplares por ano. Custa 12 dólares e cabe em qualquer bolsa. Mas também já conta com versão para Palm Pilot. A edição de 2001 chegou nas lojas e bancas nesta quarta-feira, 25.

Tim Zagat, 60 anos, autor do guia em parceria com sua mulher, Nina, 57, diz que “não há restaurante que agrade a todos; por isso o guia atende aos mais variados gostos e bolsos”. Os restaurantes são classificados de zero a 30 segundo o preço, decoração, serviço e comida. Cada estabelecimento ainda ganha comentários como “ridiculamente lotado”, “sofisticado mas econômico”, “simplicidade é o que eles têm de melhor”, “é mais um cenário do que um restaurante”, “lugar de modelos anoréxicas” ou “nem o Papa consegue uma mesa se não conhecer o dono”.

A sinceridade é o melhor ativo do guia. “Não me importo com o que o dono do restaurante ache da classificação. Se a casa está em funcionamento e serve ao público, temos de dizer como ela realmente é”, disse Zagat ao no. Os restaurantes são divididos em cerca de 40 categorias como “brunch”, “ambientes românticos”, “cartas de vinhos”, “os que fecham tarde”, “os que permitem fumar”. A divisão também é feita por bairros e cozinhas - em Nova York são 60 nacionalidades diferentes: de afegã a peruana passando por senegalesa. Mas as cantinas italiana batem o recorde. Já a cozinha brasileira tem 15 restaurantes listados com observações como “ultrapassa a bossa-nova no tamanho das porções”, “carne caseira e drinques assassinos”, “segundo lar” e “serviço entusiástico”.

O casal diz que freqüenta 600 restaurantes por ano. Mas os Zagat não são os únicos a distribuir notas. Só em Nova York isso é feito por 20.000 voluntários. Qualquer pessoa pode mandar comentários via correio ou e-mail. Tudo começou em 1965, quando o casal mudou para Paris. A serviço de uma firma americana de consultoria, os dois resolveram torrar o salário nos melhores restaurantes de culinária francesa. De volta a Nova York, Tim e Nina continuaram suas carreiras em advocacia. Mas também passaram a ensinar aos amigos os valores da boa mesa. A turma se reunia semanalmente para avaliar os restaurantes. Em 1979, Tim mimeografou o primeiro resultado das pesquisas. “São mais valiosas que as dos críticos de jornais, pois as opiniões vem de várias pessoas”, defende. Cada amigo recebeu uma cópia e a partir daí, o guia se alastrou em progressão geométrica. A votação é sempre baseada em um questionário. O primeiro livro foi publicado em 1982.“Uma democracia gastronômica”, classificou a revista Time.

Como sempre, há novidades a cada edição. Na deste ano o melhor serviço e comida ficou com o Le Bernardin. O Danube encabeça a lista dos novos. As estrelas do guia são Danny Meyer e Michael Romano, dono e chef do Union Square Café que está no topo da lista como o melhor restaurante da cidade. O Gramercy Tavern vem em segundo e também é da dupla Meyer-Romano. O restaurante de Alain Ducasse a novidade que produziu o maior anti-climax do ano. Ganhou o apelido de Ducash referência a seus preços espantosamente altos _ 160 dólares por pessoa. O guia registra o aumento médio de 9,5% no preço das refeições dos 20 restaurantes mais caros que cobram, em média, 76 dólares.

Nestes 21 anos, o sobrenome Zagat se tornou um império. Hoje, 45 cidades têm seu guia. Vinte e sete só nos Estados Unidos, além de cidades canadenses, Londres, Paris e Tóquio. Isso significa 17.000 restaurantes classificados e um exército de 100.000 voluntários em todas essas cidades. O guia também já entrou no ramo de hotéis e mapas. O escritório de Tim e Nina conta com mais de cem funcionários, que ocupam cinco andares de um prédio na Columbus Circle, coração de Manhattan. O casal costuma almoçar ou jantar fora cerca de dez vezes por semana. Nos fins de semana cozinha em casa para seus dois filhos Ted, 25 e John, 23, principalmente desde que comprou uma casa em Dutchess County, ao norte do estado de Nova York, há três anos.

Por essas e outras, os nova-iorquinos acabaram dependendo de listas. A cidade é cheia de códigos. Ninguém vai a shows, por exemplo, sem consultar a revista Time Out , que completa esta semana cinco anos em Nova York (ela é original de Londres). Mas quando se trata de festas, o babado fica por conta da Bernardo’s List, uma lista semanal enviada gratuitamente, somente por e-mail, para os, até agora , 8.000 assinantes. Bernardo Joselevich, 38 anos, seleciona o supra-sumo dos eventos que agitam o mercado financeiro e o Silicon Alley, a comunidade pontocom de Manhattan e divulga as coordenadas. Ele é CEO do site DuttyFreeGuide.com e freqüenta pelo menos três festas por noite, sem falar nas happy hours e congressos – lugares ideais para se trocar cartões de visitas. A lista já se tornou uma commodity tão quente que quem apresentá-la na porta de certos eventos tem direto a descontos no ingresso. Nem todos os mortais podem ser assinantes da lista – a divulgação é na base do boca-a-boca. Um assinante envia um e-mail para um amigo, com o endereço eletrônico para a inscrição. Todos acabam imprimindo a lista e a guardam no bolso. Na falta do que fazer, a salvação é o Bernardo.


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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