Apertem os cintos
10.janeiro.2001
Tania Menai, de Nova York
"Senhores passageiros, quem fala é o comandante Silva. Nosso vôo até Xangai terá duração de 27 horas, numa altitude de 30 000 pés. Por sinal, este é o meu primeiro vôo, sem ter nunca pilotado um simulador. Mas não há de ser nada. Dêem uma rezadinha, relaxem e boa viagem."
Se você acha essa situação irreal, pense no mundo corporativo: que espécie de preparo os executivos têm antes de assumir as rédeas de uma empresa? Em geral, a resposta é: nenhum. Estudar casos de sucessos e fracassos do passado é uma coisa. Colocar a mão na massa é outra. Para oferecer um treino prévio aos administradores, existe a dinâmica de sistemas, uma metodologia de simulação das variáveis da gestão. A metodologia está sendo aplicada de diferentes maneiras por consultorias internacionais como a McKinsey, a Andersen Consulting e a A. T. Kearney, além de empresas como GM, Intel, Ford, AT&T e Visa. Ainda assim, o uso da simulação é pouco difundido. O primeiro livro sobre o tema, Industrial Dynamics, foi escrito em 1961 pelo americano Jay W. Forrester, pesquisador de engenharia eletrônica do Massachusetts Institute of Technology, o MIT, em Boston. Ele transplantou a teoria de controle da área de exatas para a de administração e acabou solucionando, na época, um problema de oscilação de inventário da GE. Quarenta anos depois, só existem cerca de 40 especialistas do assunto no mundo. Todos são discípulos de Forrester e formados no MIT. Um deles é o paulista Paulo Gonçalves, que, aos 32 anos e buscando um título de Ph. D., estuda o assunto desde 1997. Em seu escritório no MIT, Gonçalves conversou com EXAME:
Princípios básicos
A teoria de controle e o pensamento sistêmico permitem a caracterização de um sistema na forma de equações diferenciais. Como o resultado não é simples, inventamos os management flight simulators - simuladores, como os de vôo, para a área de administração. São jogos que criam situações similares às encontradas nas empresas. Por exemplo, há o jogo da cerveja, que mostra a cadeia de distribuição de uma cervejaria - uma fábrica, um distribuidor, o atacadista, o ponto-de-venda. Responde em tempo real às ações dos jogadores. Os jogos existem tanto em tabuleiro quanto na Internet.
Onde aplicar
Inicialmente, Forrester previa que a metodologia seria aplicada apenas num contexto industrial ou corporativo. Mas, ao longo dos anos, vimos bons resultados em outros campos, como desenvolvimento urbano, telecomunicações e saúde. No setor petrolífero, a Shell vem desenvolvendo projetos desde os anos 70. A GM tem um grupo que usa dinâmica de sistemas em projetos de consultoria. Existe até simulador para gerenciar times de futebol americano, com o acompanhamento da curva de rendimento de cada atleta. A Marinha americana utiliza o método para avaliar o impacto de novas tecnologias na construção de navios. Engenheiros da Inglaterra e da França recorreram à simulação no projeto do túnel sob o Canal da Mancha. Em escolas, está sendo usada para o ensino de biologia e até de literatura. E, é claro, em cursos de administração.
Lições do passado
A People’s Express era uma companhia aérea famosa, até desaparecer em 1981. Chegou a ser a empresa que mais crescia nos Estados Unidos. Mas não resistiu ao crescimento rápido e faliu. Hoje, um simulador baseado nessa companhia permite que executivos testem planos e avaliem os resultados. A Southwest Airlines, a empresa aérea americana de maior produtividade atualmente, utilizou o simulador para pôr à prova suas estratégias de mercado. Outro caso típico é o da Atari, a líder em videogames na década de 80. Ela fez as vendas explodirem, mas não calculou que cada família só precisava de um aparelho para jogar. Depois de ter atendido todo o mercado, a Atari faliu porque não havia criado um produto para dar continuidade. Não basta você ter uma visão correta - é preciso avaliar constantemente as estratégias. É importante ver onde elas são falhas e onde podem causar problemas no futuro.
[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
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