Todas as reportagens

Outras reportagens de: no.com.br

- Oficialmente mortos
- Fuga sobre rodas
- Dia especialmente escolhido
- A caipirinha dos sarados
- Paz no Oriente Médio
- Seda, perfume e sangue
- O quê, meu rei?
- Todo mundo foi
- O 'darling' brazuca
- O avesso da notícia
- Pulitzer em foco
- Vale a pena ver de novo
- Arte em série
- Nova York, para sempre
- Músico incidental
- O Harlem não é mais aquele
- O Rio para inglês ver
- Fábrica de idéias
- Morte ronda o MIT
- Movimentos da intuição
- A bíblia da boa mesa em Nova York
- Os top de linha da mídia
- Eu, eu mesma, Luana
- Faro fino

Rudy, expulso de casa e sem herdeiro
19.julho.2001

Nenhum nova-iorquino se espantaria ao esbarrar com Rudy, também conhecido como prefeito Rudolph Giuliani, numa bela madrugada de verão carregando seu travesseiro debaixo do braço. Por sinal, nesta cidade ninguém se espanta com nada. Nem mesmo com as farpas trocadas entre Rudy e sua ex-mulher, Donna Hanover. Há mais de uma semana, o prefeito republicano está passando as noites – provavelmente em claro – na casa de um amigo, na rua 57. Inclusive, recebendo visitas de sua namorada, Judy Nathan. Donna e os filhos, Andrew, de 15 anos e Caroline de 11, continuam ocupando as amplas dependências da residência oficial, a Gracie Mansion, no Upper East Side.

O prefeito muda de cama, mas oficialmente ainda não de endereço. Ele continuará a exercer suas funções políticas e receber convidados para eventos oficiais na Gracie Mansion. Rudy e Donna, que decidiram separar-se em novembro passado, declararam na época que permaneceriam na mansão até o fim do mandato, dia 31 de dezembro deste ano. Na primeira noite em que Rudy buscou o ombro amigo na rua 57, o tablóide "New York Daily News" colocou um exército de 17 jornalistas e estagiários para cobrir o escândalo. O ombro em questão é de Howard Koeppel, que, segundo o "New York Times", colaborou com 22.000 dólares nas campanhas de Rudy desde 1989. Em pleno tratamento de câncer de próstata, Rudy não responde perguntas sobre sua vida pessoal em entrevistas. Há poucos dias, o republicano chegou a insultar dois jornalistas que tocaram no assunto divórcio com vara curta numa coletiva.

No entanto, há quem diga que o prefeito planeje sair de mala e cuia da Gracie Masion em poucas semanas. Neste caso, ele pretenderia alugar um apartamento num prédio alto, com porteiro (um custo um tanto quanto exorbitante em Nova York), e dois ou três quartos. Sua intenção seria desembolsar algo entre 3.000 e 5.000 dólares de aluguel por mês. Nota-se claramente que ele anda desconectado do mercado imobiliário há quase oito anos. Para repetir o comentário de um jornalista do Daily News: "Good Luck". Aí vai outra sugestão, seu prefeito: dê uma olhadinha nos anúncios do Village Voice – quem sabe o senhor não arranja um roommate para chegar a este preço? O que ele procura não sai por menos de 9.000 dólares; uma festa para os corretores.

A novela não seria tão apetitosa para a mídia local não fosse o advogado de Rudy, Raoul Felder, o mesmo que impõe as regras de Luciana Gimenez para Mick Jagger. Autor de um guia de Nova York e apresentador de um programa de rádio sobre legislação, Felder está envolvido em todos os quiprocós conjugais de onde voam porcelanas chinesas e colares de pérolas – para citar alguns descasados, Donald Thrump, Liz Taylor e Anthony Quinn. Casado com uma também advogada de divórcios (o dia em que eles resolveram se separar, a coisa vai ficar feia), ele confessa que a mulher é mais bem-quista nos meios legais do que ele.

Se a saída da residência oficial é motivo para risos, a sucessão este ano, nem tanto. Na semana passada, pisou pela primeira vez na cidade como presidente o texano George W. Bush. Defensor da moral e bons costumes, a visita do republicano durou apenas seis horas – o suficiente para deixar os motoristas de táxi da cidade xingando mamãe Barbara devido às ruas bloqueadas. Quando uma repórter perguntou ao presidente se ele gosta de Nova York, ouviu a seguinte resposta: "O dia está bonito". Escoltado por Rudy e pelo governador George Pataki, também republicano, "W", como é chamado pelos nova-iorquinos, corrigiu a sinceridade e disse amar a cidade. A recíproca, porém, não é tão verdadeira assim: nas eleições no ano passado "W" perdeu por 25 pontos percentuais no estado.

Em Nova York, a imagem dos republicanos não anda lá muito kasher. Aliás, nunca foi. E Giuliani, eleito em 1992 e reeleito em 1997, perdeu uma grande oportunidade de emprestar sua imagem reformista ao partido. Rudy foi o primeiro prefeito republicano eleito desde 1965. Quando assumiu em 1992, a cidade exportava violência e era dona de um índice de desemprego de 29,7%, entre 1990 e 1992. Nestes quase oito anos, o setor privado criou mais de 430.000 empregos na cidade – uma expansão recorde. Hoje, a economia local emprega 3,72 milhões de pessoas. Ao mesmo tempo, o programa de "Tolerância Zero", aplicado pela polícia – às vezes exageradamente, como no caso Amadou Dialo, um jovem inocente que foi alvo de 71 tiros na porta de casa – fez a violência despencar, pelo menos nas áreas mais conhecidas e nobres da cidade.

Contudo, Giuliani não está deixando o legado para um sucessor. "Ele deveria ter criado um candidato para as próximas eleições que tivesse história em administração pública e cujos ideais fossem compatíveis com o seus. Agora é tarde demais", disse, em entrevista ao no., Steven Malanga, do Manhattan Institute for Policy Research. Malanga acrescenta que há uma desconexão entre os diversos participantes do partido e falta uma ideologia comum. Exemplo disso é o fato de o candidato republicano nas eleições para prefeito em setembro próximo ser o titã da mídia Michael Bloomberg, um empresário da elite, que registrou-se como republicano recentemente e que contratou consultores democratas. Malanga acredita na possibilidade de Rudy apoiar Bloomberg em sua campanha, mas isso é o máximo que ele pode fazer. "Bloomberg provavelmente não tem as mesmas idéias que Giuliani e não conhece a cidade o suficiente. Acho pouco provável que ele se eleja." Sem contar que Nova York está cada vez mais negra e latina. Os brancos estilo American beauty, tradicionais seguidores do partido republicano, estão deixando a cidade rumo aos subúrbios, além de estarem cada vez mais abertos para idéias democratas. "Giuliani foi uma exceção na aceitação da cidade aos republicanos. Tudo o que ele capitalizou nos últimos oito anos, não terá continuidade. Estamos ameaçados de ver todas as suas inovações evaporarem", acrescenta Malanga.

Um pouco demais para o estimado presidente W. engolir em apenas seis horas num "dia tão bonito".


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

---

voltar