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Dia especialmente escolhido
11.setembro.2001

Jan Theophilo e Tania Menai

Não foi escolhida ao acaso a data do maior atentado da história dos Estados Unidos. Exatamente hoje seria realizada a sessão plenária de abertura da Assembléia-Geral da ONU. Delegações diplomáticas de todos os países membros estão hospedadas na cidade, que praticamente não tem mais quartos disponíveis nos hotéis. Se os terroristas buscavam holofotes, além de ter atacado em casa a nação mais poderosa do planeta, criaram uma situação muito mais emblemática do que o seqüestro e morte de um grupo de atletas israelenses, durante as olimpíadas de Munique, em 1972. Para os nova-iorquinos, e em especial para os brasileiros que vivem em Nova Iorque, foi como assistir ao Cristo Redentor se esfarelando diante dos olhos.

O carioca Leonardo Zraick, 29 anos, estava em seu escritório da Salomon Smith Braney, no 29º andar de um prédio bem em frente ao World Trade Center, em Nova Iorque, quando uma cena que só vira em filmes começou a se desenrolar pela janela atrás da mesa de seu chefe. "Ouvimos uma explosão e corremos para a janela para ver o que era. Ninguém sabia o que havia acontecido, achávamos que podia ser uma bomba. Devia ser por volta de 8h50 quando vimos o segundo avião bater num dos prédios e explodir", conta. Uma gigantesca coluna de fumaça e poeira comecou a se formar, enquanto os colegas de escritorio de Leonardo partiam para as escadas de incêndio. "Mesmo sem saber direito o que estava acontecendo, tínhamos noção de que se tratava de algum ataque terrorista", diz.

Somente na rua, Leonardo teve a dimensão da catástrofe. Inúmeros motoristas pararam os carros e ligaram os rádios a todo o volume para que os demais pudessem ouvir os relatos. "Olhei para trás e vi o prédio desabando. Tudo o que vocês viram na televisão, eu vi a menos de um quilômetro de distância. Não cheguei a ver mortos, mas vi muita gente pendurada no World Trade Center" , diz. Segundo Leonardo, não houve nem tempo de surgir policiais para organizar um esquema de evacuação. "As pessoas nas ruas começam a gritar get out , get out . Saí correndo a toda, mas as ruas estavam caóticas. Acabei me abrigando na casa de uma amiga, distante uns 30 quarteirões do World Trade Center", conta.

O caos a que Leonardo se refere podia ser sentido num rápido passeio pelas ruas de Nova Iorque. O metrô foi fechado e as principais avenidas da cidade foram bloqueadas para o tráfego de ambulâncias e carros dos bombeiros e da polícia em especial os furgões azul-claros do esquadrão anti-bombas. Na Times Square, em frente à Nasdaq, centenas de americanos acompanhavam chocados os acontecimentos pelo gigantesco telão do mercado. Nem a Nasdaq nem a Bolsa de Nova Iorque abriram pela manhã. A todo o momento e praticamente por toda a cidade ouvia-se o ruído das mais variadas sirenes.

No momento da explosão, a também carioca Fernanda Pucheu, 28 anos, entrava no Metrô, duas estações antes do World Trade Center, para chegar ao trabalho na área de marketing do portal StarMedia. "De repente um maluco entrou gritando que havia acontecido uma explosão. No primeiro momento ninguém deu bola, até porque sempre tem uns malucos berrando dentro do Metrô de Nova Iorque", lembra ela. "Mas os alto-falantes do Metrô anunciaram que havia acontecido um atentado e que as operações seriam suspensas. Os poucos trens que ainda estavam em movimento inverteram suas rotas para deixar os passageiros o mais distante possível do World Trade Center, no Distrito Financeiro. Na saída da estação, fiquei impressionada. As pessoas saíam das escadas e começavam a se abraçar, chorando, tamanho o desespero", conta Fernanda.

A brasileira Carolina Scheinberg, 23 anos, se formou em comunicação pela Universidade Simmons, em Boston, ano passado. Com o término do curso, foi trabalhar em Nova York, onde está há dois meses. Chegou à cidade ontem, após passar uma semana com os pais em São Paulo, e contou ao no. por email que muitas pessoas estão indo aos supermercados comprar água e alimentos.

"Estou a umas 20 quadras de onde aconteceu tudo. Na rua onde estou, o único indício da tragédia é a quantidade de pessoas na rua que estão andando de Wall Street para cima, porque os serviços dos ônibus e metros foram interrompidos. Há muita gente indo comprar comida e água, muita água, porque estão preocupados que a poeira e a sujeira tenham contaminado a água encanada que o pessoal bebe. Estão também comprando muita comida porque as pessoas não sabem o que irá acontecer nos próximos dias, e como NYC é uma ilha, tem gente com medo que de repente haja uma escassez de alimentos. Também muita gente indo pegar dinheiro no caixa eletrônico. O barulho de ambulância, bombeiro e policia nas ruas é constante, o tempo inteirinho. Ninguém sai de casa, no meu prédio as pessoas estão se juntando para ficar assistindo televisão juntas.”

Praticamente tudo o que há de financeiramente significativo em Nova Iorque fica no Distrito Financeiro. É onde está o prédio da Bolsa, o Federal Reserve, Wall Street e, logicamente, a redação do Wall Street Journal, um dos mais importantes jornais econômicos do mundo. Construído entre 1966 e 1977, o complexo do World Trade Center reunia cinco blocos, com 450 escritórios, hotéis, restaurantes e shopping subterrâneo com grandes lojas como Express, Warner Bros, a mega-livraria Brothers um hotel da rede Marriot. Nove linhas de Metrô passam sob o edifício que ainda servia como uma espécie de estação dos trens que partiam para a cidade vizinha de New Jersey. Com 110 andares de aço e vidro era o segundo maior prédio do mundo, perdendo apenas para uma torre da Malásia. Cerca de cinquenta mil pessoas trabalhavam no Wolrd Trade Center, mas calcula-se que mais de 150 mil pessoas entre consumidores e turistas freqüentem diariamente o local. A praça que ficava no meio do complexo é maior do que a Praça de São Marcos, em Veneza.

A bancária paulistana Ana Salles estava num táxi. Ia do Upper East Side por uma via expressa para seu trabalho no Distrito Financeiro. "Quando olhei pela janela do carro vi três pessoas penduradas nas janelas do World Trade Center. Imediatamente mandei o motorista voltar para minha casa e ligar o rádio do carro", conta ela. Instantes depois, Ana viu uma das explosões e começou a chorar. Em casa, ligou para o trabalho para saber detalhes do que havia ocorrido. Logo após a explosão houve uma tentativa de retirar as pessoas dos edifícios próximos, mas era impossível por causa da fumaça que já tomava conta de tudo.

Nada menos que 27 emissoras de televisão americanas transmitiam ao vivo e ininterruptamente as imagens da catástrofe. Há cenas aterrorizantes onde se vê uma gigantesca e densa nuvem de cinzas e poeira tomando conta das ruas enquanto policias, jornalistas e soldados do exército tentam desesperadamente escapar. São cenas que lembram filmes como Armaggedon e Impacto Profundo, nos quais Nova Iorque é duramente castigada. Até o fim do dia não havia informações oficiais sobre o número de mortos ou feridos. Os hospitais nova-iorquinos, porém, já enviaram alertas de falta de sangue em suas unidades. Colaborou Alessandro Greco


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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