Rosabeth Moss Kanter
01.maio.2000
Uma grande mulher
As empresas que não souberem inovar e derrubar a hierarquia estão com os dias contados - é o que diz a palestrante americana do momento
Por Tania Menai
Se existe uma Joana d'Arc na batalha contra hierarquia, fronteiras e rigidez nas empresas, essa pessoa é a americana Rosabeth Moss Kanter. Ela hoje é a mulher que está por trás de muitos dos grandes homens do mundo corporativo dos Estados Unidos. É alguém que está remodelando e liderando mudanças estratégicas em diversas empresas e órgãos do governo - sem falar em outras organizações mundo afora. Kanter ajudou, por exemplo, os CEOs das farmacêuticas Monsanto e Novartis na análise de projetos especiais, treinou o alto escalão da GAP Inc. para a nova estratégia necessária ao crescimento da empresa de vestuário, trabalhou na formulação de regulamentações de recursos humanos do BankBoston. Atualmente ela lidera uma equipe da IBM num programa chamado Reinventando a Educação.
Desde 1986 Kanter leciona administração de empresas na Harvard Business School, a mesma escola onde obteve seu diploma em 1960. E durante três anos ela foi editora da revista Harvard Business Review, uma bíblia do mundo dos negócios. Suas experiências resultaram em 13 livros sobre administração, liderança e sobre o dia-a-dia do mundo das corporações. No penúltimo, Classe Mundial (Editora Campus), ela diz que a globalização não deveria assustar médias e pequenas empresas. E, como antídoto, sugere a adoção dos "três cês": ser Cosmopolita, ter Conceitos e Competência. Em seu livro mais recente, Frontiers of Management (ainda não disponível em português), ela reúne crônicas e artigos publicados nos últimos dez anos, fazendo um bom desenho das mudanças no ambiente dos negócios nesse período - as empresas que deram certo, as que não deram e o que é preciso aprender para não perder o bonde daqui em diante. "Rosabeth Kanter é a única de nossos líderes acadêmicos que enxerga o business como um todo", escreveu o guru da administração Peter Drucker.
Nesta entrevista a VOCÊ s.a. Rosabeth fala de seu trabalho e de suas idéias.
A senhora escreve e respira administração há mais de 20 anos. O que mudou de lá para cá?
O mais importante é que as paredes que separavam as empresas de seus consumidores e fornecedores foram derrubadas. Há 20 ou 25 anos os negócios eram muito mais limitados e intrínsecos. Além disso, o sistema era hierárquico e burocrático, com regras, procedimentos e cargos bem definidos. O ritmo das promoções era tão lento que os profissionais focavam sua carreira como se estivessem subindo degrau por degrau. Normalmente, as pessoas em funções mais subalternas não tinham voz ativa ou influência. Tudo isso tem mudado bastante. Muitas empresas extinguiram camadas hierárquicas e eliminaram regulamentações. As melhores estão fazendo com que todos os níveis colaborem, pois elas precisam de novas idéias.
O que os administradores buscam quando a procuram?
Muitos querem inovar e não sabem como. Alguns estão trabalhando em projetos de mudança em grande escala, outros estão passando por problemas e buscam conselhos. As empresas também me procuram para que eu dê palestras sobre tendências no mundo dos negócios; outras vezes sou chamada para trabalhar com o conselho de diretores ou CEOs para ajudá-los a resolver problemas. Enfim, sou procurada por diversas razões...
A senhora tem uma receita para a excelência?
Há alguns fundamentos. O primeiro é a "imaginação para inovar". Ou seja, hoje todas as empresas devem prestar atenção nas novas idéias, incorporar novas tecnologias e investir constantemente na satisfação de seus consumidores. O segundo é "o profissionalismo para desempenhar funções". Traduzindo: as empresas devem administrar a mão-de-obra para que todos sejam estimulados a usar a mente e o senso de justiça de maneira a contribuir e fazer alguma diferença. Afinal, quem busca excelência não pode tratar as pessoas como se fossem máquinas, como se elas apenas seguissem ordens.
É preciso investir em treinamento, desenvolvimento e melhoria do desempenho dos funcionários. E fazer que eles ensinem uns aos outros e troquem idéias entre si. O terceiro é "estar aberta a colaborar". Empresas que têm excelência são focadas em seus clientes, têm uma boa parceria com seus investidores, fornecedores e com a comunidade em que trabalham.
Mas em geral as empresas tendem a perder essas características à medida que crescem.
É preciso que os próprios gerentes, ou as pessoas em posições de controle, sintam necessidade de inovação e não resistam a mudanças. O que acontece é que, em empresas grandes, as pessoas acabam se especializando em determinados setores, e então se tornam muito ligadas naquilo - e só naquilo. Para que haja interação, é recomendável aproveitar esses profissionais em projetos especiais, fora de suas funções diárias. Assim, eles terão a oportunidade de aprender, colaborar e se desenvolver. Já nas empresas menores, onde provavelmente todo mundo trabalha no mesmo prédio e se vê com bastante freqüência, é muito mais fácil trocar idéias informalmente nos corredores. Além disso, os profissionais são multidisciplinares: todo mundo faz um pouco de tudo e circula naturalmente em vários setores.
A Internet está mudando a relação entre as pessoas nas empresas?
Sim, e de uma forma geral a informação tecnológica está até acabando com a hierarquia. Você não precisa mais de gerentes intermediários, do tipo que vai às reuniões e fala pelos outros, porque as pessoas estão se comunicando diretamente. O trabalho em equipe também tem crescido, está estimulando mais e mais o senso de colaboração - hoje, por exemplo, as pessoas não precisam se reunir na mesma sala para trabalhar juntas. A Internet permite, também, que o chefão se comunique com todo mundo ao mesmo tempo. Mais fabuloso ainda é que os funcionários podem se comunicar com ele de volta! Ou seja, com a Internet todos estão se sentindo incluídos e mais bem informados.
Ser um bom administrador é algo que está no sangue ou se aprende na faculdade?
Há líderes naturais. Mas a administração como disciplina ou ciência sempre tem, como requisito, uma educação formal em finanças, operações e processos de negociação. A habilidade de administrar pessoas tem a ver com o saber liderar, e isso deve ser encorajado nas empresas. A questão não é se a pessoa nasce com essa habilidade ou se ela aprende na escola - é a cultura da empresa onde ela trabalha que vai despertar, ou não, suas melhores características. Empresas controladoras e autocratas esmagam a personalidade das pessoas. As boas empresas reforçam as habilidades e a comunicação, o que acaba puxando os profissionais para cima. Eu ensino numa ótima faculdade de administração, mas acho que as escolas não fazem milagres no que diz respeito à liderança. Isso é uma coisa que você tem de cultivar ao longo da carreira, se a oportunidade lhe for dada.
De que forma um mau administrador ou gerente pode fazer um estrago no trabalho e na equipe?
Eles fazem erros que acabam prejudicando a produtividade. Normalmente, maus administradores não ajudam ninguém a estabelecer metas, e isso faz com que as pessoas acabem perdidas. Eles não se comunicam, e gente desinformada acaba não trabalhando com eficiência, pois ao chegar ao fim de suas tarefas pára por ali, já que ninguém falou nada sobre os próximos passos. A falta de informação gera falta de motivação - e assim o desempenho despenca.
O que as empresas podem fazer para treinar bem seus líderes?
Empresas com alto grau de excelência treinam líderes para que motivem, inspirem e dêem a seus funcionários o que eles precisam para exercer bem suas funções. As pessoas têm o direito de saber o que se espera delas, como serão julgadas, quais serão seus papéis na estratégia geral da empresa, suas recompensas por bons trabalhos e conquista de metas (elas também precisam saber disso).
Há algum exagero nessa onda de mudanças trazida pela globalização e pela revolução tecnológica?
Não, nenhum exagero. Minha mensagem para o mundo dos negócios é "mudem ou mudem". Caso contrário, não há como sobreviver. O século 21 é sinônimo de informação global, e é preciso muito mais sofisticação e informação para estar no centro dos acontecimentos. Não importa em que país você viva: mesmo que a sua empresa seja voltada para o mercado local, você tem de pensar globalmente. Essas são as fronteiras da administração, os desafios que os novos profissionais estão tendo de encarar.
[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
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