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Randy Cohen
07.maio.2003

Professor de comportamento

O comediante americano faz sucesso desde 1999, no jornal The New York Times, respondendo a dúvidas sobre ética no dia-a-dia

Por Tania Menai

O americano Randy Cohen é um comediante. Mas não é para fazer graça que ele foi contratado pelo jornal The New York Times. Em sua coluna dominical "The Ethicist" (O eticista), publicada desde 1999, Cohen responde às cartas de leitores que expõem alguns torturantes dilemas éticos da vida cotidiana. O sucesso da coluna é tanto que ela já é publicada em mais 48 jornais dos Estados Unidos e do Canadá, e uma coletânea foi publicada no ano passado com o título The Good, the Bad and the Difference (O bom, o mau e a diferença). Randy, que já foi redator do programa de televisão do entrevistador David Letterman, trabalha em casa, faz palestras em empresas e recebe umas 150 cartas por semana. Para respondê-las, recorre a advogados, especialistas ou amigos. Mas, quando a coisa aperta, ele liga mesmo é para sua mãe judia (a quem dedica o livro). Falante, Randy conversou com EXAME numa lanchonete, numa esquina de Nova York.

As pessoas precisam de um eticista para pedir conselhos?
Não seria melhor ligar para os amigos ou para a família?
Pelas cartas, percebo que as pessoas já sabem o que devem fazer, mas não sabem por quê. Elas esperam que eu elabore um argumento lógico sobre a questão. Elas já devem ter falado com amigos e com familiares, mas querem a opinião de alguém de fora. Além disso, o The New York Times é muito respeitado. Tenho amigos que me conhecem há 20 anos e nunca se importaram com o que eu penso. Hoje, eles me perguntam tudo.

A corrupção nas empresas americanas veio à tona. Isso fez as pessoas pensar mais em ética?
As pessoas escutam a palavra mais vezes hoje. Mas não acredito que elas se comportem melhor do que há cinco anos. Houve época em que o mundo dos negócios nos Estados Unidos era particularmente terrível, como na década de 1890. Nos últimos dez anos tem sido assim também. O que mudou não foi o senso de moralidade, mas as leis. Se dependermos da moralidade de cada um, estamos perdidos. Na época da pós-depressão, o presidente Roosevelt reformulou as leis de trabalho durante cinco anos. E tudo passou a funcionar às mil maravilhas. O país prosperou. Mas, a partir do governo Reagan, tudo foi por água abaixo. As pessoas vêem essas leis não como um meio de fazer negócios, mas como um obstáculo. Hoje, temos mais ex-CEOs no governo do que em qualquer outra época da história americana. E esses são os resultados.

O que o senhor aborda nas palestras em empresas?
Falo muito sobre como a ética individual parece ser menos importante que valores civis. Ou seja, quem quiser fazer mudanças éticas deverá mudar certas regras da sociedade. Não basta simplesmente gritar com as pessoas para que elas sejam boas. Mas palestras em corporações me parecem não ter muito sentido. Várias vezes me convidam para falar durante o almoço, em conferências ou confraternizações. Acredito que os funcionários não conversam entre si, então precisam de algo para preencher aquela hora. Eles pensam: "Já que nosso CEO foi para a cadeia, temos de fazer algo sobre ética". Mas, enquanto falo, tudo que se escuta é o barulho dos talheres. Quem gosta gosta. Quem não gosta acha isso tudo política liberal e simplesmente esquece. Por outro lado, nada é mais estimulante que falar em universidades. Os estudantes sempre debatem e questionam as idéias com ótimos argumentos.

Um de seus leitores contou que leu o e-mail do colega do escritório assim que viu seu nome na tela do computador. Ele agiu incorretamente?
Não devemos ler o e-mail alheio. Mas, se eu visse o meu nome na mensagem, leria. Você não faria o mesmo? É errado, mas somos apenas humanos. Contudo, devemos agir como se não o tivéssemos lido. Um pouco de hipocrisia não é ruim. Às vezes é bastante útil. Ela torna nossas relações humanas mais suaves.

Quais os assuntos de trabalho mais questionados nas cartas que o senhor recebe?
Questões do tipo: se o chefe tem direito de ler o e-mail deles ou se pode limitar o acesso à internet, se quando eles já acabaram o trabalho no escritório podem usar o tempo para tratar de assuntos pessoais. O que mais me impressiona é o quão tolerantes as pessoas são. Elas aceitam de seus chefes tratamentos que jamais aceitariam do governo. Há um imenso sacrifício da vida privada. Elas acham que só porque o chefe é dono do prédio e do computador pode fazer tudo o que quiser. Não, não pode! Hoje o que vale é: "Se você não gosta da maneira como é tratado nesse trabalho, procure outro". Isso é ridículo.

Quais os profissionais que mais o procuram?
Médicos me escrevem com dúvidas o tempo todo. Advogados, quase nunca. Eles acham que já sabem a resposta. Por outro lado, nunca recebi uma carta sequer de CEOs das empresas da lista das 500 maiores da Fortune ou de funcionários do atual governo.

O senhor acha que alguém do governo iria lhe escrever?
Pode-se dizer qualquer coisa do nosso presidente, menos que ele seja uma pessoa que pensa profundamente e é inclinado a auto-exame. Nem seus amigos diriam isso dele.

E quando o chefe é malandro, rude e não tem ética? Deve ser denunciado a um superior?
Essa é uma pergunta que recebo freqüentemente. Sim, é uma obrigação denunciar alguém que faça algo errado, seja roubar material de escritório ou simplesmente ser um chefe terrível. Essas perguntas são difíceis de responder, porque as pessoas odeiam dedo-duro. Os termos em inglês que designam essa característica são todos pejorativos. Apenas um se salva: "assopra-apito". Quem dedura muitas vezes acaba arruinando a própria carreira. É preciso pesar se vale a pena fazer isso pela empresa.

Vale mentir no currículo?
Certa vez, um leitor me perguntou se poderia deixar o doutorado de fora do currículo. Ele achava que tinha uma educação acima do normal e que, por isso, não seria chamado para entrevistas de emprego. É errado. O empregador deve saber da sua história educacional e profissional.

Numa entrevista de trabalho, temos de dar informações sobre a idade e a vida particular? Uma mulher, se está grávida, deve informar isso?
Uma pessoa não é obrigada a responder a perguntas desse gênero de maneira nenhuma. Nos Estados Unidos, perguntas assim são proibidas por lei. É proibido não empregar ou deixar de promover alguém por causa de gravidez. Se o empregador faz essa pergunta, isso significa que a resposta influenciará na decisão final do emprego. Perguntas sobre gravidez, casamento ou idade são muito intrusivas. Uma leitora grávida de sete semanas me perguntou se deveria contar ao chefe. Ora, nesse estágio de gravidez tem gente que não conta nem para os pais! Agora, se você estiver buscando um trabalho de carregadora de piano e estiver com seis meses de gravidez, a lei permite ao empregador não lhe contratar. Em qualquer outro caso, não. Ter filhos é um processo natural da vida. As empresas devem incentivar os funcionários a levar uma vida saudável.

Qual a sua idade?

Tenho 54 anos. E não estou grávido. Cuidado. Você pode se prejudicar por ter feito essa pergunta.


[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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