Chef Masa
29.junho.2005
Tania Menai, de Nova York
Seus críticos não economizam adjetivos. Seus clientes não economizam dólares. Para muitos, uma noite no restaurante japonês Masa, em Nova York, “equivale a uma viagem”. Aberto há pouco mais de um ano no quarto piso do Time Warner Center, na Columbus Circle, o templo é chefiado por Masayoshi Takayama, ou Chef Masa, um japonês simpático, de fala mansa e com ambição suficiente para encarar uma clientela que desembolsa, feliz, $350 por jantar, por pessoa – sem incluir a bebida. “Sublime”, “zen”, “inegualável”,”mágico”, “puro êxtase”,”qualquer sinônimo de delícia” são alguns dos suspiros impressos nos guias, revistas e jornais que visitaram o restaurante.
Chef Masa cresceu rodeado por peixes, no mercado dos pais. Desde cedo, aprendeu com sua mãe a cozinhar e a servir. Ao completar o científico, trabalhou no restaurnate do Ginza, em Tóquio. “Trata-se uma loja sofisticada, que abriga um restaurante – aprendi bastante lá”, conta ele. Em uma viagem para a Califórnia, onde Masa foi jogar golfe, ele notou que sushi estava virando um prato famoso. Então resolveu abrir o seu restaurante, o Ginza Sushiko, em Berverly Hills.
Mudar para Nova York foi um sonho que levou 23 anos para acontecer. Chef Masa também é dono do anexo Bar Masa, que serve sushi e sopas por um preço acessível a mortais. Nenhum dos dois ambientes têm janelas, o que isola os visitantes do barulho e da realidade de Manhattan. Assinada pelo designer Richard Bloch, a decoração é simples, as cores são claras, nada é ostensivo. Foi lá que Chef Masa recebeu a Expressions em uma manhã de segunda-feira. Sentado informalmente no balcão onde serve seus sempre boquiabertos clientes, ele contou sobre sua história, comentou sobre a comunidade japonesa de São Paulo e revelou que o Masa recebe muitos brasileiros para jantar. “Sem contar o brasileiro que trabalha no bar”, acrescenta.
Quais as tradições da sua família e infância no Japão que o senhor carrega consigo?
Meus pais tinham um pequeno mercado de peixes – este foi o ambiente em que cresci. Naturalmente, eu via muitos peixes, comia peixes diferentes, das diversas estações do ano. Eles cozinhavam para 150, 200 pessoas – inclusive para funerais. Quando eu era pequeno, eu ajudava, e aprendi sobre sopas, grelhados, sashimi, entradas, todos os tipos de comida. Aprendi com meus pais que o mais importante é o menu sazonal. O Japão tem todas as estação bem definidas e cada uma delas nos proporciona alimentos diferentes, sejam legumes, carnes ou peixes. Aprendi a apreciar os ingredientes e a misturá-los.É importante respeitar as estações, isso é que a minha mãe fazia. Já na Califórnia, todos os alimentos estão disponíveis durante o ano inteiro. Aprendi muito da minha mãe e dos cozinheiros do Ginza. Sushi, sashimi...A partir daí, tudo passa a ser a minha criação como chef. Não copio ninguém, tampouco cozinhas italiana ou francesa. Este tipo de cozinha não me atrai. Gosto de fazer tudo no meu estilo – o estilo Masa. Isso é muito importante. É o que faz a diferença.
Alguns críticos dizem que vir ao Masa equivale uma voyage. O que faz uma refeição sua tornar-se uma viagem?
Veja como o meu restaurante é simples, sereno. Quando as pessoas entram aqui, procuro fazê-las se sentirem mais confortáveis, relaxadas, fazer deste um novo mundo. Do lado de fora, vê-se muitos prédios, carros, trabalha-se muito, o tempo todo. Por isso tento criar uma outras atmosfera – com a comida, peixes, ingredientes, frescor. Quero fazer as pessoas sonharem – não só através dos alimentos, mas também na parte sensorial e visual. Eu desenho muitas das minha própria louça, ainda temos flores. É uma experiência completa.
O crítico do New York Times não lhe economizou elogios e disse ainda que “não se consegue comer assim em Nova York por um preço inferior”. Por quê?
É muito difícil preparar estas refeições por um preço mais barato. Noventa e cinco por cento dos meus ingredientes vêm do Japão. Os peixes recém-pescados do norte e no sul do Japão são enviados a Tóquio. De lá, eles são enviados dia sim, dia não para mim, em Nova York. Não são peixes congelados, são frescos. Claro que isso não é barato, mas qualidade é algo muito importante. E é por isso que as pessoas se impressionam tanto. As pessoas sabem o quão fresca a comida é.
Há muitas diferenças entre o público de Nova York e o público de Los Angeles?
Acredito que não. Quase todos os dias recebo gente da Califórnia. Hoje mesmo terei quatro deles para jantar. Já os nova-iorquinos são bastante exigentes – e é isso que torna o trabalho desafiador. Levei vinte e três anos para deixar a Califórnia e vir para Nova York. Sempre quis vir para cá, mas nunca achava o momento certo. Sabe, uma boa oportunidade vem na hora certa. O dono do restaurante Perse, vizinho ao meu, contou-me sobre o novo projeto em Nova York. Vi a planta do edifício e decidi mudar para cá. Fechei o restaurante em Berverly Hills e vim. Os nova-iorquinos respeitam bastante os chefs – e respeitam muito a mim. Assim como os californianos, eles gostam de novidade, de experimentar pratos novos, saber daonde vem, como são preparados. Eles sempre me perguntam. Eles amam comer. Adoro esse tipo de gente. Eles estão sempre em busca de boa comida. E eu também. Esta é a minha paixão.
Uma busca na expressão “cozinha japonesa” no site de livros Amazon.com resultou em 17 mil títulos. É possível aprender a preparar comida japonesa a partir de um livro de culinária - ou é preciso também aprender a cultura que vem por trás dela?
No caso de sashimi, por exemplo, cada peixe deve ser cortado em uma direção. Mas isso é coisa para profissionais. As pessoas que cozinham em casa podem aprender com livros – mas aprenderão somente o básico. Sushi, sashimi, sopa. Isso funciona com qualquer outra nacionalidade, seja italiana ou francesa. Para aprender cozinha japonesa, é ideal que se visite o Japão, para aprender a cultura e o lado espiritual – e a tradição.
Como é o seu cotidiano?
Chego aqui por volta das nove ou dez da manhã. Espero o peixe chegar do aeroporto JFK – agora mesmo estou a espera, sei que o avião já pousou vindo do Japão. Tenho uma pessoa que espera as cinco ou seis caixas serem liberadas pela alfândega, e as traz para o restaurante. Uma vez que os peixes chegam, todos começam a cortá-los para a mesma noite e para a noite seguinte.
Seu restaurante não tem menu. O senhor planeja os pratos de acordo com os ingredientes. Como eles são escolhidos?
O homem com quem trabalho no Japão me conhece há muito tempo. Ele conhece as estações e sabe do que eu gosto. Sempre conversamos sobre o que está bom naquela estação. Depois lhe passo um fax com meus pedidos e ele me manda. A cada semana há mudanças no fundo do mar. Vivemos na terra, não sabemos o que acontece no fundo do mar. Mas novos peixes nascem. Em fevereiro em Nova York ainda é um gelo, mas no Japão a primevera já começa a brotar – e isso se pode ver no mar. Então trago estes peixes para cá e as pessoas começam a sentir o sabor da primavera. Isso faz parte da cozinha japonesa.
Em Nova York, os chefs costumam ter mais liberdade de criar e misturar ingredientes do que em seus países natais. O senhor também sente esta liberdade?
Sim. Há uns 15 anos criei um frois gras dentro do cardápio japonês – derretia na boca. Uso caviar, trufas brancas, negras. Nova York é perto da Europa – isso faz com que tenhamos acesso a vários ingredientes. Também tenho fornecedores locais, não vou a mercados – mas 95% do que usamos vem do Japão.
Que tipo de restaurantes o senhor frequenta em Nova York?
Ontem foi meu aniversário e fui para o Peter Luger Steak House, no Brooklyn. Este é um dos meus restaurantes prediletos. Gosto muito de comida coreana, eles usam bastante legumes, sopas de peixe e usam condimentos picantes. Na verdade, não gosto muito de comida ardente. Gosto de comida simples, sem muitas complicações. Não gosto de coisas que exigem gente tocando a comida ou muitos molhos. Gosto de simplicidade. E amo carne. Inclusive, já estive na churrascaria brasileira Plataforma.
Em Nova York, existem centenas de restaurantes japoneses onde pode-se comer por 10 ou quinze dólares. O que o senhor acha destes restaurantes?
Nunca os visitei.
O senhor cozinha em casa?
Sim. No sábado passado preparamos um porco de 3 meses e um carneiro de 3 meses, tiramos a carne da perna. Fizemos shabu-shabu. Minha namorada também cozinha.
Quais aspectos do Japão que o senhor sente falta?
Sinto falta das estações. Estou aqui, mas sei o que está acontecendo lá agora – que tipo de flores, que tipo de legumes, que comida eles estão desfrutando lá. Mas como tenho contato com o meu fornecedor de lá, não sinto tanta falta. Sempre que tenho tempo, vou para lá, viajo pelo país, encontro pessoas. Meus pais estão lá, meu irmão também.
Qual a importância da bebida na cozinha japonesa?
As pessoas podem beber o que quiserem. Mas este tipo de comida é bem acompanhada por alguns tipos de saquê, de vinho ou de champange. Muitos me perguntam o que beber, e eu recomendo. Mas hoje, as pessoas estão menos preocupadas com o quê combina com o quê. Eles bebem o que gostam e saboreiam a comida separadamente. E não há nada de errado nisso.
Para o senhor o que seria uma refeição perfeita?
Para nós, chefes que trabalhamos no balcão de frente para o público, sabemos que se dez pessoas vierem para jantar aqui, dez pessoas terão gostos diferentes. Sei que durante o tempo em que elas estiverem aqui, terei de levá-las para uma viagem. Preparo sushi, sashimi, mas ao mesmo tempo, tento conversar com os clientes, tento me aproximar deles – tenho que satisfazê-los em vários sentidos. Comida, bebida, sensações. Aí sim, eles ficam satisfeitos. Não basta entupí-los de comida. Há de haver sentimento. Eles entendem o que eu quero passar. Quando se vai a um restaurante e se sente o prato, é possível saber qual a filosofia do chef. E como chef, tento alcançar o coração de cada clientes, aproveitamos juntos a criação de cada prato. Eles ficam horas no meu restaurante.
Cozinhar no balcão, criando conexão com os clientes, deve fazer bastante diferença, não?
Sim. Em restaurantes frances ou italianos, os chefes ficam na cozinha, e têm uma câmera na sala de jantar. Eles vêem o que está se passando ou o quão rápido as pessoas comem. Mas eu fico no balcão e vejo a reação das pessoas imediatamente. Cada mesa é diferente. No começo, pergunto se alguém é alérgico a algum peixe, como carangueijo ou camarão. Depois começamos o menu. A cada dia vivo uma nova experiência. E estando tão próximo, posso escutá-los exclamarem “uaaaaaau!” Meu objetivo é fazer com que o cliente aproveite 100%. Trabalho cada vez mais para escutar um “uaaaauuu, isso é muito bom”. Se eu não escutar isso, perdi. Se escutar, ganhei.
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Masa e Bar Masa
Time Warner Center
Columbus Circle, New York
Tel. 212. 823.9800
Recomenda-se reservas
com antecedência.
Jantar – de segunda a sábado.
Almoço – Terça a sexta.
www.masanyc.com
[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
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