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Watts Wacker
18.julho.2006

De olho no futuro

Tania Menai, de Nova York

Todas as manhãs o futurista Watts Wacker, de 53 anos, se olha no espelho e vê um garoto de 25 anos, com um longo futuro pela frente. Seu primeiro livro, o best-seller The 500 Year Delta, foi traduzido para 10 idiomas e entrou para a livraria da NASA; sua quarta obra sobre mitologia e negócios será lançada em fevereiro. Watts, como gosta de ser chamado, é consultor de várias empresas e ainda colaborou com o Manual de Negócios do Financial Times. Ele foi consultor da área de pesquisa de opinião pública do canal de televisão Fox e dirigiu o mesmo setor para a revista Time. Hoje, lidera a empresa First Matter, sediada em Westport, Connecticut. Watts, que ajuda CEOs a visualizar aonde estão e para onde vão, diz que os executivos com mente aberta sabem que a melhor fase para se contratar alguém como ele é quando a empresa está no topo do mundo. “As pessoas com poucas perspectivas não contratam gente como eu até que esteja no fundo do poço”, ressalta. Sobre o futuro, ele brinca que pode inventar o que quiser. Nesta conversa por telefone com a Exame, porém, ele disse que a única coisa da qual ele tem certeza é que “um otimista tem um ótimo futuro. E o mesmo não acontece com um pessimista”. E acrescenta: “a maneira como organizamos nosso futuro, tem a ver com o que acontecerá pela frente”.


O senhor se autointitula de bobo da côrte. Como isso se traduz para a sua relação com o mundo corporativo?

O bobo da corte, o mágico, o shaman e o bobo do vilarejo têm o papel de transformar. Normalmente, quando trabalho com empresas, elas estão no ponto A e sabem precisam ir para o ponto B. Mas não sabem que nem o que é o ponto B ainda. Além disso, o mágico, o bobo da corte é sempre uma visão de fora. No filme O Senhor dos Anéis, Gandalf era permitido visitar, mas nunca ficou muito tempo em nenhum lugar. Então o mágico é aquele que te dá perspectiva de fora. E isso só pode ser feito por um período curto de tempo, porque senão você passa a ser um deles – a isso eu chamo processo de “enculturação”. Nas corporações, eu desafio seus sensos de convenções. A pergunta mais importante que ouvi na minha carreira foi “qual o melhor critério para se avaliar o sucesso do meu negócio?” Fiquei muito intrigado em achar esta resposta. Mas ela é simples: o melhor critério é ter mantido seu negócio por um longo tempo. Por exemplo, como a GE ainda está no mercado e seu maior concorrente WhiteWestingHouse não está? Existem pelo menos 300 que estão aí há mais de cem anos. Na Europa tem algumas que chegam a 500 anos. Pesquisamos, os quatro pilares em comum que mantêm as grandes corporações centenárias de pé: (1) todas elas têm acesso a capital. (2) Uma sensibilidade incrível com seus credores e funcionários (stakeholders). Uma empresa Fortune 500 tem uma média de 80 grupos de credores e funcionários. (3) Elas desafiam o convencional. (4) E nenhuma delas tem mais como fonte de renda os mesmos produtos ou serviços que elas tinham quando foram criadas. A GE não é mais uma empresa de energia – é maior institução financeira do mundo. O mesmo acontece com a DuPont. E a Nokia, não fazia telefones celulares 170 anos atrás.

Como aplicar as teorias do futurismo em paises emergentes, onde a economia é incerta?

Uma coisa boa sobre para os paises que não estão no Primeiro Mundo, é que a economia chegou a um ponto que eu gosto de chamar de auto-catalisadora; ela se alimenta de si. Há várias maneiras de criar riqueza e novos lugares onde há valores – a nova frase para isso é “o mundo é plano”. Por menos que exista menos infra-estrutura, regulamentações bancárias e regras monetárias, esses países têm pessoas criativas, talentosas e ambiciosas. Acredito muito que os poderes não-industriais do século 20 podem ascender no século 21.

O senhor usa a mitologia na consultoria de empresas. Como funciona?

Os mitos não são compreendidos no mundo de hoje. Mas eles estórias verdadeiras, e não verídicas. Há apenas 17 destas estórias que vivemos hoje. E cinco podem ser aplicadas às corporações: a jornada do herói, a criação do mito, a transformação, a queda e redenção, e a encruzilhadas. Na categoria dos heróis, entram os empreendedores, como Bill Gates, da Microsoft, ou Howard Schutlz, do Starbucks, que fez do café deixar de ser uma coisa mundana para ser a bebida de adultos do século 21. E também Phil Knight, CEO da Nike, que viu que corredores precisavam de um tênis melhor. É aí que nasce uma corporação; e ela passa por transformações seja quando seu fundador morre, como no caso de Walt Disney, ou quando ela abre o capital. Esses três mitos – herói, criação e transformação - ocorrem uma vez na vida das corporações. Mas todas têm de se manter atualizadas com o espírito da empresa. Por exemplo, o Cadilac usa música do Led Zepellin hoje em sua propaganda. Quando eu era pequeno, este era um carro de homens ricos. Mas a empresa quer ter certeza que seus mitos estão de alinhado com os novos tempos. Nos últimos dois mitos, queda e rendenção, entra o caso da Johnson & Johnson, que teve um caso prejudical à empresas com seu remédio Tylenol. Já a encruzilhada é quando empresas são obrigadas a tomar decisões. Sempre digo aos CEOs: chega uma hora em que a não tomada de decisão é uma decisão.

O que as experiências com os departamentos de pesquisa e opinião pública da Fox e da Time lhes ensinou?

Elas são muito importantes - mas elas nos permitem apenas a olhar a temperatura. Ainda temos de ver como está o clima em geral. Não basta saber se está chovendo. É preciso saber se é verão, primavera, outono ou inverno. Pesquisas sozinhas tem o mesmo poder de prejudicar ou ajudar. É preciso entender o contexto. Gosto de pesquisa de consumidores porque eles sempre exageram na resposta. Mas nós também sempre exageramos com a constistência. E é por isso que pesquisa funciona. Somos capazes de criar maneiras de detectar os graus de exagero. Por exemplo, as pessoas dizem que compram 12 tubos de pasta de dente por ano. Mas, na verdade, elas compram apenas quatro. Então sabemos que para pasta de dente, o fator de exagero é três para um. Ou seja, se alguém me falar que comprou 15 tubos, vou logo saber que o número real é cinco. Acredito em pesquisa – mas não acredito que este seja a único critério a partir do qual empresas devam tomar decisões.

A Kodak já passou a ganhar mais dinheiro com a era digital do que na era de filmes. Algum outro exemplo de empresas visionárias deste calibre?

Uma das empresas mais visionárias de hoje é a British Petroleum – ela mudou o cálculo de seu setor ao se dedicar ao lubrificantes ecológicos. Eles foram os pioneiros, e hoje todas as empresas de petróleo estão lhes seguindo. Esta foi uma medida bastante corajosa. Outro bom exemplo é a British Airways, que teve a brilhante idéia de criar um lounge no desembarque, para quem chega, e não apenas para quem embarca. As demais companhias aéreas acabaram copiando. E esta é a melhor maneira de medir se aquela é, de fato, uma boa idéia. A Toyota também é um grande exemplo tanto na área de fabricação quanto na área de segmentação de mercado. Eles reconhessem as mudanças demandadas pelos consumidores, como a prepcupação ecológica. A Hallmark, que faz cartões para todas ocasiões, de aniversário a batizados, encontrou criou o nicho da comunicação corporativa, que rende cerca de 800 milhões de dólares. E isso ocorreu numa época em que muita gente passou a enviar cartões virtuais.

O senhor costuma enfatizar que maneiras que serviam para o sucesso antigamente não funcionam mais. Hoje a informação é uma das ferramentas vitais para uma empresa, certo?

Certamente. Antigamente, quando se pensava no chefe que tomava decisões, a idéia era que isso acontecia num cenário estático. Hoje tudo é dinâmico e pouco previsível. É um erro achar que as ferramentas do passado serviriam a seu favor hoje. E a melhor delas hoje chama-se “assimetria positiva”. Isso significa, saber usar o que você tem de melhor e aplicar em novas áreas. A GE recentemente entrou na área de energia eólica e solar; é o que eles chamam de Eco-imaginação. Sua propaganda é um elefante dançando numa floresta tropical com a música Singing in the Rain. Quem imaginaria uma empresa fundada por Thomas Edison ter um comercial deste? Esta propaganda é tida como o melhor comercial dos últimos dez anos. Um exemplo oposto a este foi o próprio Jack Welsh, tido como o melhor CEO dos últimos 100 anos. Bem, ele decidiu parar de investir num projeto chamado “Genie”, há cerca de 15 anos, quando a internet estava começando. Se ele tivesee continuado este projeto, este seria algo como o Yahoo. Mas ele não pensou assim. Ele prefere estar num negócio no qual ele seja o número um ou dois no mercado. E isso fez com que ele deixasse de investir em novos setores. Além da informação, outro aspecto importante é desafiar o convencional regularmente. Sem falar na constante educação e treinamento dos funcionários. E a última dica é usar o que você tem de melhor em áreas que você nunca imaginou. Por exemplo, a IBM ganha mais dinheiro hoje oferecendo serviços e consultoria do que vendendo produtos. Antigamente eles vendiam computadores.

Quais das suas previsões mais deixa as pessoas de cabelo em pé?

A maior delas é quando eu digo que o século 21 não será um século americano, como foi o século 20. Passamos a era pós-americana. China, India, União Européia e todos os recursos vindos de relações como, por exemplo, Brasil e China. A segunda idéia que assusta as pessoas é o alcance a tecnologia “senient” ; a fusão de carbono com silicone, a fusão de pessoas com máquinas e máquinas pensando como pessoas. E isso vai acontecer num curto prazo. Gordon Moore, co-fundador da Intel, disse há 25 anos que o poder do silicone iria dobrar a cada dois anos, e que seu custo iria cair pela metade. Ele estava certo. É como dizer que um carro como Gol da Volkswagen tem mais componentes computadorizados hoje do que a nave enviada à Lua em 1969. Hoje todo mundo sabe disso. É mais fácil as pessoas compreenderem quando já passou do que quando ainda está por vir. Em 10 anos, a capacidade do silicone vai dobrar cinco vezes mais e o custo vai cair cinco vezes mais. Isso significa que um iPod terá um tamanho mínimo e custará em média seis dólares. E por que não tê-lo implementado embaixo da sua pele? Então quando falo que a minha filha que hoje tem 16 anos, viverá 120 anos, as pessoas não acreditam. Também fui ridicularizado há 10 anos quando disse que epidemias seriam a principal causa de morte em cinquenta anos. Só pararam de me ridicularizar quando apareceu SARS e a gripe aviária pela frente. Sem falar na AIDS. O primeiro mundo está cada vez mais polarizado.

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[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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