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Vik Muniz
01.outubro.2006

Tania Menai, de Nova York


O entusiamo é quase infantil. Os olhos, azuis. O chinelo, Havaianas prata. Passava de onze da manhã quando cheguei, também de Havaianas (douradas) e ligeiramente atrasada, no estúdio de Vik Muniz. Culpa da demora da linha G do metrô que navega pelo Brooklyn, onde vive este fotografo que gosta de brincar com acucar, chocolate e Playmobil. Falante, Vik circula pelo estúdio, um ambiente claro, de paredes brancas e teto alto, mostrando o projeto de sua nova exposição Pieces of Junk que inagura na galeria Sikkema & Co em Nova York, no dia 9 de setembro. Numa maquete da galeria, ele indica aonde vai cada foto. Depois explica cada uma delas: amontoados de sucatas que revelam imagens mitológicas, alem de imagens aéreas que fez em Minas Gerais: são fotos de desenhos gigantes feitos em planaltos; formas perfeitas de uma chave, um dado, um homem, uma mulher. Esta é apenas uma das galerias que representam seu trabalho em San Francisco, Madri, Paris, Moscou, Toquio, e, claro, na capital paulista. Sem falar na lista de museus que inclui o Metropolitan Museum e o MoMA, em Nova York, a Tate Modern e o Victoria and Albert Museum, em Londres, e o MAM em Sao Paulo.

Enquanto isso, sua assistente trabalha minuciosamente num trabalho comissionado por uma familia de Londres, colocando pigmentação sobre uma foto preto e branca de pai, mãe e filha. Ao lado, uma caixa com carreteis de cordas náuticas. Para que? “Um navegador mandou da Nova Zelândia quer que eu reproduza com cordas a foto do barco dele”, conta Vik, atendendo idéias alheias, como se as suas não bastassem. Sua mais recente obra, no entanto, chama-se Mina. Produto de seu casamento com a a artista plástica Janaina Tschäpe, Mina, que nasceu em janeiro, circulava pela casa de colo em colo com uma camiseta amarela com a ilustração de uma caveira na barriga. É ela uma das maiores fontes de aprendizado e inspiração deste papai paulista que deixou o Brasil há mais de 20 anos e diz que “levou 17 para fazer sucesso da noite para o dia”.

Sentado numa chaise longue, Vik conversou com a V em seu templo preferido: um canto da casa (geminada ao estúdio), onde estão seus livros, empilhados em prateleiras que dariam inveja a qualquer livraria. Alguns deles, de sua autoria, como o recente Reflex. Fascinado pelo Google Earth, essa criança de 44 anos, deu a volta ao mundo em um de seus mega Macs para mostrar todas as casa da família – no Rio, em São Paulo e na Bocaina. Com uma exposição programada para o Paço das Artes, em São Paulo no primeiro semestre de 2007, antes de começar a entrevista, Vik soltou uma nova informação: “ah, sabia que entrei para o Getty Center de Los Angeles? Era o único museu de arte moderna que faltava nos Estados Unidos”. Mas isso é só um detalhe.

Há um excesso de imagem no mundo?

Não necessariamente. Vamos supor que, na natureza, cada folha seja uma espécie de imagem. Você não tem que olhar todas elas. O excesso de imagens faz com que você edite mais o que você absorve. Isso cria uma dinâmica de visão, onde não apenas a persepção é importante, mas também a atenção e um certo dissernimento visual. As pessoas hoje se preocupam não apenas com o que estão vendo, mas com o que elas não estão vendo. Ou seja, ver, hoje, consite tanto em ver como em ingnorar o visual que está em volta de você. Mas isso também é baseado em educação e cultura. Algumas delas desenvolvem capacidade de dissernimento mais efetivo do que outras. A educação vigente não está capacitada para trabalhar com imagens da maneira que está capacitada para trabalhar com mensagem escrita.


Como assim?

No começo do século passado, época da revolução industrial, quando todos os sistemas de educação foram implementados, demandava-se mão-de-obra burocrática. Tinha-se que saber escrever a máquina, documentar transações – letras e números. Então a ênfase da educação sempre foi dirigida para matemática e línguagem escrita. Isso é muito diferente da época vitoriana, quando, sem o aparato fotográfico, as pessoas tinham que aprender a desenhar. Isso dava a elas uma educação visual muito grande. E ao ultilizar a o lado esquerdo do cérebro, o direito também se beneficia. Sempre cito Marshall McLuhan (1911-1980) quando ele se referia a maneira como a população se protege do desenvolvimento tecnológico das mídias. A educação está aí para que a pessoa que lê saiba se proteger da que sabe escrever. Hoje estamos lidando com mídias que foram desenvolvidas há milhares de anos. E não estamos protegidos, principalmente na era digital.

Não?

Na publicidade, por exemplo, antigamente você precisava de um slogan muito grande – os redatores trabalhavam em textos enormes. O público via imagens e lia. Hoje, a elasticidade da imagem digital é tal que não é preciso de slogan ou texto pra explicar nada. O branding tornou-se muito mais importante em publicade e marketing do que a necessidade de explicar o produto. Você coloca aquilo ali do jeito que você quiser. Just do it. Isso tem a ver também com a rapidez como as pessoas absorvem a imagem hoje. A cada década, a gente duplica a velocidade com a qual apreendemos as imagens.

E com essa velocidade, sabemos discernir as diferentes mensagens?

Pegue estes reality shows. Como uma criança vai saber o que é verdade, o que é notícia, e o que é ficção? A produção de mídia hoje está baseada em confundir estas noções. Preocupa-me muito esta escalada de produção de imagem, tanto sua velocidade, quanto tecnologia, e a falta de recursos educacionais para proteger a população disso. Tenho filhos, e penso nisso. Como não vejo ninguém fazendo nada sobre isso – e já que tenho conhecimento sobre o assunto – cabe aos artistas começar este movimento. O McLuhan falava que era a gente que tinha que começar as coisas. Estou tentando criar uma linguagem visual que dá ao público uma idéia de que ele é participativo – assim, a apreensão da imagem se torna uma atividade interativa, onde 50% vem da imagem e 50% vem de quem vê.

Então a educação visual está defasada em relação à escrita?

Vivemos num mundo onde as imagens são super transparentes. Faço isso isso e tenho participado de conferências de gente que está interessado em desenvolver a idéia de aprimovar a educação visual no ensino básico.Mas isso é um diálogo muito maior do que o meu trabalho ou do meu público. Dependo de gente na área de pedagogia, psicologia, gente que têm outras ferramentas. Pretendo me envolver bastante nessa área. Mas aí também dependemos de política e economia – e não sei se é do interesse geral fazer as pessoas ficarem mais espertas. Estamos remando contra a maré.

E como isso poderia ser feito?

Uso a mesma fluência do que um trabalho de publicidade. Mas como o meu trabalho não está aí para vender nada, só ele mesmo, ele funciona como um anti-corpo. Quero usar essas imagens fáceis e rápidas, que entram no subconciente das pessoas, e funcionam como uma vacina. E como as imagens que eu faço são básicas, são coisas que todo mundo já conehce, já viu, isso tem um poder bastante forte em relação a quem vê. Queria fazer uma coisa menos idealista e mais prática. Muito pouco tem sido feita neste sentindo. O caminho é enorme e exitante.

Você passou duas semanas numa ilha perto de Maui no meio de uma baía que não tinha sem telefone. Como é pra você ficar desconectado?

É meio amendrotador. Ultimamente tenho conseguido fazer mais isso, com muita inspiração da Janaina. Ela gosta de desaparecer. Eu sou paulista, sempre tive essa coisa de estar sempre plugado. Então aonde eu vou, meu computador está ligado wireless, recebendo emails. Não gosto de ser achado, mas gosto de saber que tenho conexão para o que eu precisar. A internet virou uma loucura. Como também sou professor, apesar de não dar aula agora, tenho acesso a consórcios de bibliotecas – adoro livros. E estar longe deles é uma coisa que me perturba muito. Então quando me perguntam o que você levaria para uma ilha deserta, eu diria que eu levaria a Biblioteca Nacional. Ou a Library of Congress – com a cafeteria. (risos). São um bilhão de livros. Seria uma ilha ótima, aí eu ficaria numa boa. E ainda com o New York Times chegando todos os dias ali.

Por onde você navega na internet?

A beleza da internet é como a descrição do livro de areia do escritor Jorge Luis Borges: você vira uma página, e ali está sempre outra. Eu vejo desde música havaiana até filosofia econômica européia do século 19 (risos).

Você não tem vontade de fazer cinema?

Tenho. Quando começei a desenhar, descobri um nicho muito grande. Ao pular de uma tecnologia para outra dentro desta coisa gráfica, não me faltou oportunidade e nem vontade de trabalhar com imagem que se move. Mas até agora, meu problema com cinema é o controle. Sou muito controlador – quero que o trabalho tenha a ver com a minha mão em quase tudo. Desde a minha concepção até a criação, e a apresentação. Você viu as minhas maquetes. E no cinema, você tem que delegar muito. Mas o meu trabalho também tem mudado - até um tempo atrás eu não tinha assistentes. Com a grande demanda pela minha arte, tenho que me diversificar e me multiplicar. Assim, posso tomar conta também da parte mais conceitual, mais intelectual. Tenho que ter tempo para ler, para viajar, viver, para continuar a ser um bom artista. Tem que cuidar do espírito. A matéria básica do que você faz é o mundo. Não é o estúdio. Você tem que ter essa relação com o mundo, que é muito intensa. Então você tem que ter tempo.

Então o empecilho é mais técnico do que artístico?

Meu problema com o cinema é que quando uma imagem está se movendo, as pessoas páram de se mover. Não existe uma imagem estática – se ela fosse estática, ela não existiria. Para um coisa existir para o cortex visual, ela tem de se mover de alguma forma. O sapo não come a mosca morta porque ele só consegue vê-la quando ela se move. O cortex visual do ser humano é bem parecido com o do sapo. A distância que as pessoas se posicionam em relação a um quadro de acordo com o seu tamanho. E se aproximam e se afastam – e este balanço lhes colocam num lugar entre a tinta e a paisagem. Este momento mágico onde a matéria se transforma numa imagem, é o sublime da arte – principalmente na pintura. É uma experiência cinemática, que acontece por causa do movimento do corpo. E o meu problema com cinema é justamente este: você cria este movimento se dá fora do corpo, se torna uma coisa mental completa.

Mas você curte um filme, né?

Adoro cinema. Inclusive estou escrevendo um roteiro há mais de quatro anos. É uma comédia. Nem sei se vou fazer. Mas não sei se eu dirigiria – prefiro escrever e produzir. É um roteiro sobre meu trabalho – é sobre uma pessoa que não está preparada para a velocidade da mídia, aquilo que acabamos de falar aqui. Ela sai de uma cidade sem eletricidade no norte da Paraíba nos anos 80, e vai trabalhar na casa de uma atriz de novela no Rio de Janeiro. E ela pensa que a novela é verdade. O roteiro se chama Telenovela. Adoraria fazer com o Paulo Machline, um amigo de infância, com quem a idéia surgiu num papo de bar. Todo o meu interesse é sobre a realidade e a mentira.

Isso soa uma boa comédia...

Gosto de comédia, o humor é uma coisa muito poderosa. Quando você ri, você está se abrindo inteiro para a informação que está vindo. O meu trabalho lida muito com humor e com ilusão de ótica. Trata-se de criar convenções e quebrá-las ao mesmo tempo. Uma piada é isso, você cria uma convenção e de repente tira uma parte onde a estrutura cai. Quem está ouvindo a piada, cai junto. E isso é o que cria o riso – o riso é um momento de liberdade. Meu diretor predileto é Pedro Almodóvar - ele consegue colocar tudo dentro de uma comédia, até o drama. Tudo cabe numa comédia – dá para falar de coisas muito profundas, muito bonitas de uma forma muito eficiente – mais do que aquilo que já está etiquetado como drama. Toda a arte tem que ser completa neste sentido.

Você acompanha o trabalho de artistas contemporâneos?

Para falar a verdade, sou um espécie de traidor da minha própria classe. Não olho muito para a arte contemporânea. Uso uma analogia simples: quando você dirige um carro, você olha para frente, e para trás, pelo retrovisor. Você não dirige olhando para os lados. Senão você bate. E eu não quero bater em ninguém. Geralmente, gosto de coisas muito fora do que eu faço, como pintura, por exemplo. Saio de casa para ver uma exposição de pintura, mas raramente para ver uma mostra de fotografia. Acabo vendo, já que estamos em Nova York - e ainda fico amigo desses caras. Mas isso complica ainda mais a coisa. Tem gente que eu admiro muito como o fotógrafo Hiroshi Sugimoto, que tenho no meu quarto. Ele é cotemporâneo – mas acho que ele é tão do meu jeito. Também gosto da Cindy Sherman. Mas prefiro ver uma coisa que já aconteceu, porque eu tô fazendo o que vai acontecer. O presente é muito rápido – não tenho muito interesse nele. Inetresso-me pelo passado e pelo futuro. Sou sagitariano, aquele bicho de quatro patas, com um rabo para trás e a fecha lá na frente. Tenho essa coisa de arqueiro. Aqui, agora, já passou.

Daonde surgiu a idéia de misturar sucata e mitologia ?

Não gosto muito de revolução, prefiro evolução. Temos que dar tempo para as coisas. Ao mudar para este estúdio, maior, há uns anos, descobri que eu estava perdendo a relação de tamanho. Entre o tamanho original da coisa e o tamanho que ele aparece na fotografia. A mudança de escala na fotografia é uma coisa muito interessante. Você vê uma coisa grande numa fotografia pequena, a escala entre o objeto fotográfico e o que ele representa você pode causar grandes discrepâncias – isso te faz pensar sobre a fotografia. Comecei a fazer um trabalho com brinquedos. Fotografava de um ângulo, criava uma quebra entre o plano da imagem e a prespectiva de onde aquela imagem estava sendo criada. Fiz com outros materiais e resolvi fazer com sucatas, coisas em desuso. Ai começei a buscar um lugar para fazer este projeto – aqui em Nova York isso se tornou impossível por causa do preços das coisas. Aí econtrei esse lugar no Rio de Janeiro, que pertence a uma ONG, onde meninos fazem um estágio com a gente em turnos de três meses. Esta é oportunidade para essa moçada trabalhar com algo legal, interessante. Encontramo o Pereirão, que têm uma infinidade de sucata. E levamos seis meses para fazer a primeira imagem. Este projeto foi uma parceria com o Fábio Ghivelder – ele foi incrível, pois eu não posso estar lá o tempo todo.


Que trabalheira, Vik...

Além disso, tive que equipar o laboratório fotográfico do Rio de Janeiro para revelar filme oito por dez metros. É uma idéia que parece simples, mas foi complicado. Mas com perseverança sai. E o mais interessante foi que para resolver um problema técnico de revelação de filme no Rio, acabei pesquisando tanto que terminei desenvolvendo um método com câmera digital e agora faço parte de um congresso com o pessoal da National Geographic. Você nunca sabe aonde um problema pode te levar.

E o tema veio quando?

Depois disso tudo. Geralmente começo fazendo auto-retrato, para ver se dá certo. Assim você não tem nada a perder, com a tua cara você não tá ofendendo ninguém. Só a você mesmo (risos). Já no auto-retrato eu fiz uma coisa meio idealizada, estilo Rembrandt (pintor holandês), de turbante, com casacos, aquela coisa do orientalismo, meio chique – e fiz isso com a sucata. Neste processo, fiquei pensando no idealismo. O que é o ideal? O que que é bom? A idéias dos deuses – e eles têm sempre essas fábulas morais – é justamente isso: existe toda essa cacofonia de significados que povoa o universo. Para você conseguir a simplicidade de uma estrutura moral, você precisa limpar, sempre subtrair. Então a idéia de você pegar um mar de sucata, e limpar dali o vazio da realidade das coisas, é justamente o que cria a possibilidade de uma fábula moral. A moral da história. Esses deuses não só são ideais, mas são perfeitos – porque têm ideias precisas. É puro significado – e você consegue o puro significado só com limpeza. Eu já tinha feito um trabalho assim no Brasil, com lixo de carnaval. Depois de limpar, a luz que passava através daquele lixo era a imagem da criança. A criança não era feita de lixo – o lixo estava em todo lugar. A criança é feita de luz. Quanto à sucata, há um aspecto transformativo.

E caótico ao mesmo tempo, não?

Adoro a idéia de caos. A minha mente é obsecada em dizer histórias de corpos que se transformam. A idéia de ter essas formas que emergem dos caos é uma obsessão minha muito antiga. Essas coisas de ver um número dentro de uma asa de borboleta, um inseto que parece uma folha. Camuflagem é uma coisa que adoro, entro em sites de caça e fico vendo roupa de caça. Já viu o uniforme novo do Iraque? Eles usam aqueles quadradinhos que usam em caça.

Me diz, qual o futuro da fotografia?

Da mesma forma em que a fotografia em 1839, a fotografia chegou para acabar com a pintura – e na verdade, a fotografia liberou a pintura dessa obrigação factual. Essa obrigação de registrar o mundo. E passou a ser como Leonardo (da Vinci) dizia, essa cosa mentale. A pintura passou a ser uma coisa puramente mental, intelectual, cultural. O pintor não parou de pintar porque a fotografia foi inventada. Ele começou a perguntar o que é a pintura? Por que se pinta? E descobriu-se que a razão pela qual se pinta pouco tem a ver com o mundo como ele existe. As pessoas pintavam porque elas queriam estabelecer uma relação entre a maneira como elas vêem as coisas e como as coisas poderiam ser.

A fotografia digital mudou tudo então?

O que está acontecendo com a fotografia é quase o reflexo do que aconteceu com a pintura em 1839. O fotógrafo ficou liberado da relação factual que ele tinha com o mundo. Tanto que hoje, um documento fotográfico ser passado num tribunal, ele tem que ser muito analisado, para saberem se é verídico – hoje, uma fotografia não quer dizer de forma alguma que aquilo aconteceu. A fotografia, finalmente, através do computador se liberou da relação que ela tinha com o mundo. E ela virou também uma coisa mental. O que resta para o fotógrafo são as mesmas opções que os pintores tinham: se isso não quer dizer que não é verdade, então o que é isso? E por que as pessoas fotografam? E o que é uma fotografia? As pessoas se perguntam muito pouco isso.

E o que te amedronta mais em relação a isso?

Acho interessante no futuro da fotografia é o lugar onde a gente coloca a nossa história. Com a invenção do photoshop, foi um marco que passou muito desapercebido, na minha opinião. Acho que um dia, as pessoas ainda vão olhar para esse dia, no começo dos anos 90. As pessoas ainda vão olhar com muito mais seriedade para isso do que elas olham hoje. Por que, pensa bem, aonde a gente vai colocar a nossa história Antes tínhamos os quadros. Depois as fotos que documentavam fatos. E agora ? Os lugares onde você coloca a memória digital não duram mais do que dois ou três anos. Você tem que ficar passando de uma mídia para outra. É muito delicado tudo isso. É efêmero. Da mesma forma, as pessoas começam a se desconectar dos fatos. Veja estas guerras que temos hoje. A distância entre as imagens e os fatos é imensa. A ligação química que a fotografia tinha com a guerra, não existe mais.

O que o nascimento da Mina, em janeiro de 2006, mudou em sua vida?

Tudo. Tenho um filho de 16 anos, então já passei por esse processo um vez. Engraçado, passar por esse processo de novo em uma outra etapa da sua vida muda tudo também. Me sinto muito mais um avô, sou muito mais permissivo, estrago muito mais a menina do que o meu outro filho. Mas interessante porque é uma outra etapa profissional da minha vida. Adoro o que faço e trago isso para minha casa – e o contrário também acontece. Então fico estudando essa criatura,ela é fascinante, cada dia ela aparece com uma coisa nova. Isso é muito inspirador. Uma pessoa que está vendo as coisas pela primeira vez, que está em relação com mundo visual, como se tudo fosse novo, e não tem nenhuma categoria de coisas. Deve ser uma grande viagem de ácido o que ela está vivendo. As coisas são todas meia ligadas, ela não sabe se uma coisa que está em cima de uma mesa faz parte da mesa. E através dos olhos da Mina eu vou vendo um mundo completamente autista e indiscritível. É muito importante você poder visualizar isso para fazer arte neste mundo cheio de imagens.

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[ copyright © 2004 by Tania Menai ]

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