Edward Lawler
04.janeiro.2007
"Os talentos são maltratados"
Um dos maiores especialistas americanos em recursos humanos diz que a maioria dos chefes não sabem administrar bons profissionais
Tania Menai, de Nova York
O acadêmico americano Edward Lawler III, especializado em psicologia e administração, é daqueles que enxerga a empresa como um conjunto de profissionais com diferentes ambições e talentos – o que ele chama de capital humano. Professor de University of Southern California Marshall School of Business, em Los Angeles, e fundador do Centro para Organizações Eficientes, na própria universidade, ele é autor 36 livros, um deles intitulado “Trate Bem as Pessoas!”. A mídia especializada americana já o considerou um dos seis gurus de negócios do país e uma das pessoas mais influentes na área de recursos humanos. Sua publicação mais recente, lançada nos Estados Unidos em julho passado, chama-se The New American Workplace, uma co-autoria com James O'Toole, do mesmo centro de estudos. A obra surge como um novo capítulo de Work in America, lançado por eles em 1972, traçando as principais mudanças do mundo corporativo neste período.
Seu livro retrata mudanças no mundo corportativa nos últimos 34 anos. Quais os pontos principais?
As diferenças são enormes, especialmente por causa da tecnologia e da globalização. Hoje, o desempenho, a habilidade e a administração tem de ser muito melhor do há 30, 20 ou até mesmo 10 anos atrás. Trata-se de estudo imenso que fizemos, onde apresentamos pesquisas de 16 empresas. Passamos um ano e meio agregando todo este trabalho. Aqui, levantamos tendências e ambiente de trabalho nas corporações americanas e ressaltamos assuntos como educação, satisfação, necessidades financeiras, psiscológicas e sociais.
Teoricamente, todas as empresas reconhecem que o talento humano é um ativo precioso. Na prática o que se vê é que a maior parte das companhias têm grandes dificuldades em captar e reter bons profissionais. O que explica esse paradoxo?
Há uma diferença entre dizer que capital humano é importante e dizer que vamos administrá-los de uma forma que nos dê uma vantagem competitiva por meio de capital humano. Então, não basta dizer que é importante – isso exige um compromisso maior. É preciso focar em o que em valor e capital humano que pode te fornecer um valor competitivo no mercado. Muitos executivos que tenho visto não aplicam esforços ou análises necessárias para criar uma competência superior na administração de capital humano – desde recrutamento até desenvolvimento e organização de pessoas.
Por que não?
Na maioria das vezes eles são mais atraídos pela administração de ativos financeiros, para o qual foram treinados – é onde eles se sentem mais confortáveis. Mais do que lidar com aspectos de capital humano. Por exemplo, em empresas de petróleo muitos dos executivos sêniors são engenheiros ou pessoas da área técnica - é onde eles dispensam a maior parte do tempo.
Qual o incentivo que o senhor considera hoje mais eficaz para manter um talento dentro de uma empresa? É só uma questão salarial ou existem outras variáveis importantes?
Há quatro aspectos mais comuns que contam na hora de reter profissionais, apesar das variáveis de aspirações pessoais. Mas em geral, conta a relação social com o chefe imediato pesa bastante, o salário que recebem em comparação com o mercado, o trabalho em si – se ele apresenta desafios -, e a mobilidade para crescer na empresa. Para atrair profissionais, estes quatro tópicos são igualmente relevantes, mas adicione aí a reputação da empresa. Leva-se em consideração se o nome daquela empresa pode ser um passo para algo maior, por exemplo.
Quais as empresas no mundo que o senhor considera benchmark na questão de captação e retenção de talentos. Por que?
Isso varia de setor. Mas nos Estados Unidos, não há muita surpresa. Na área de administração a GE é um lugar atraente para quem faz carreira executiva. Na área de software, Google é hoje o lugar quente para se estar, competindo efetivamente com a Microsoft, em reter os melhores talentos. Sem contar a Apple, claro. No setor de varejo, a Nordstrom tem uma ótima reputação, incluindo as estatégias de marketing. Ainda há a Procter & Gamble, para os interessados em publicidade e marketing – muita gente gosta de começar a carreira lá. No mercado financeira, provavelmente o melhor em atrair e reter gente é a Goldman Sachs, ele fecham grandes negócios e pagam incrivelmente bem.
O senhor acha que o departamento de recursos humanos exerce hoje, mesmo,um papel de vilão corporativo?
Historicamente o RH não é visto como o grupo mais eficiente de uma empresa. Certa vez um CEO me descreveu o RH como a “Unidade de Prevenção de Negócios”, alegando que o RH sempre lhe dizia o que ele não deve fazer – e nunca o que ele devia fazer ou como tornar o negócio mais eficiente. Concordo com ele. Por muito tempo, a função ganhou poder e respeito em manter pessoas fora de problemas, evitando sindicatos ou processos judiciais. Em vez de indicar o que fazer de melhor em comparação a outras empresas. Pelo menos nos EUA, não se trata de um departamento para seguir uma carreira de executivo sênior. Já no Japão o RH é considerado um importante passo.
Algumas especialistas apostam que o departamento de recursos humanos tem seus dias contados dentro das empresas. Dentro dessa visão, suas funções seriam absorvidas por cada uma das áreas de uma companhia. O que senhor acha dessa previsão?
Com as empresas tornando-se globais uma das funções do RH – a transacional e burocrática - está cada vez mais terceirizada. Ainda assim, é preciso ter alguém capaz de administrar fornecedores, saber lidar com contratos. A Unilever por exemplo assinou um contrato de um bilhão de dólares com uma empresas de RH global. As questões estratégicas, como os consultores, também estão sendo terceirzadas para empresas como a McKinsey, por exemplo. Uma pesquisa da United Airlines chegou a conclusão que o número de pessoas que eles precisam de fato no RH deles são oito – apenas pessoas sêniors capazes de administrar os terceirzados. Não acho que a função vai desaparecer, mas acho que o perfil mudará – serão pessoas mais analíticas, estratégicas e capazes de acrescentar mais no que se trata de perspectivas de negócios. Até o nome está deixando de ser RH para ser Administração de Capital Humano.
Qual a urgência que o senhor vê hoje nas empresas no que diz respeito à capital humano?
As empresas erram em não reconhecer que precisam de alguém que seja mais do um líder-herói. Elas precisam de alguém forte, que entenda todos os aspectos emoresariais e tenha liderança principalmente em adminstração de talentos. Esta é uma área crucial. Sem habilidade de recrutar talentos – e permití-los se desenvolver continuamente -, não haverá sucesso financeiro, nem aumento de negócios.
Como inserir esta mentalidade nas empresas?
Algumas delas já reconhecem esta importância, mas este aspecto não pode ficar restrito à área de recursos humanos. Cada parte de uma organização deve não só se preocupar com os seus talentos, mas também com a forma que estas pessoas são utilizadas na administração, assim como o desenvolvimento desses profissionais. Passar esses valores adiante dentro de uma empresa é uma tarefa árdua para várias equipes de recursos humanos. Isso vai além de suas responsabilidades e daquilo para o qual forma treinados. Tradicionalmente, eles recrutam, desenvolvem e lidam com a compensação financeira. Nada mais. O resto deve ser feito pelo resto da empresa.
O senhor tem PhD em psicologia. Isso lhe ajuda a entender melhor as aspirações e frustações de profissionais corporativos?
A raíz do meu trabalho sempre foi olhar para os indivíduos nas organizações e tentar compreender o que os motiva, quais são seus padrões de comportamento. Minhas primeiras pesquisas sempre focaram em motivações, sejam elas resultado de sistemas de premiação, de características de tarefas ou de trabalhos. Talvez eu possa enxergar além de pesquisadores que estudaram organizações – vejo contexto de indívíduos dentro de corporações, em vez de olhar a organização primeiro e o indivíduo em segundo. Analiso a maneira como estes profissionais são impactados pelas práticas do trabalho.
Qual o foco de pesquisa do Centro para Organizações Eficientes?
Há cerca de 60 empresas que nos sustentam financeiramente. Nossas principais pesquisas são centradas em projetos individuais que muitas vezes são financiadas por empresas. Outras vezes, pesquisamos pontos específicos de empresas, como a forma que elas são moldadas, por exemplo. Também fazemos pesquisas nacionais – uma mais recente tratou do desempenho de conselhos corporativos. Enviams pelo correio questionários para todos mebros de conselhos de empresas Fortune 200, perguntando o que eles sentem sobre a eficiência de seus conselhos corporativos e sobre salários de executivos. Esta seja talvez uma das maiores das nossas pesquisas recentes – enviamos estas perguntas a 1400 profissionais.
O senhor também trabalha um pouco com governos. Qual a maior diferença entre organizações governamentais e as corporações?
Governo não é uma porção muito grande do nosso trabalho, mas fazemos pesquisas para parte do governo britânico e para a marinha americana. Há uma grande diferença entre governo e corporação. Obviamente governos não têm consumidores, e não têm o mesmo objetivo de resultados. Dito isto, eles não são tão focados no mercado, e tem mais resistência no que diz respeito à mudança. Isso torna um trabalho mais desafiante para nós.
Direfentes personalidades são atraidas por diferentes carreiras?
Certamente. O que mais me intrigava em psicologia desde o começo era justamente esta diferença entre indivíduos. Depois de 40 anos estudando indivíduos e organizações, aprendi que até podemos generalizar, mas é bom lembrar que o que você disser não será válido para todo mundo. Há diferenças maravilhosas entre seres humanos que nunca desaparecem – pelo contrário, com o tempo, só aumentam. Por mais que vivemos hoje numa sociedade cada vez mais globalizada, isso ainda não abafou as diferenças entre indivíduos dentro de um mesmo país, quem dirá entre países e culturas.
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[ copyright © 2004 by Tania Menai ]
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